terça-feira, 11 de dezembro de 2012

Por que o brasileiro médio não acredita em Darwin? (entrevista com Ricardo Waizbort)

Leia a íntegra da entrevista que Ricardo Waizbort, biólogo da Fiocruz, concedeu à CH On-line
Por: Franciane Lovati
Publicado em 30/08/2006 | Atualizado em 05/11/2009





A que podemos atribuir a baixa aceitação da teoria evolutiva no Brasil?
Ricardo Waizbort
– É preciso entender que, quando falamos em evolução, estamos tratando de um assunto bastante abrangente. Uma pessoa que não tem um ensino formal bem estabelecido vai responder a essa questão de forma superficial, pois não compreende o que é a teoria de Darwin. Mesmo entre os biólogos ela ainda é discutida; na educação fundamental e de nível médio, é pior ainda. É um problema educacional mais complicado, que não abrange apenas essa teoria, mas a ciência como um todo. As pessoas não são capazes de pesar argumentos e evidências a favor ou contra determinado conhecimento e por isso não são capazes de verificar sua validade. Vivemos uma batalha muito mais retórica, de convencimento e persuasão, do que uma batalha racional, em que são expostos argumentos e evidências para debate. No Brasil, vemos uma situação de analfabetismo científico muito preocupante, porque existem problemas na formação e atualização dos professores.

O que pode estar errado com o ensino para que as pessoas não compreendam as teorias científicas?
“Em biologia nada faz sentido senão à luz da Evolução”, escreveu o biólogo Theodosius Dobzhansky em 1973. No entanto, se você analisar os livros de biologia atuais, a evolução está perdida em muitas outras informações. O estudo dos vegetais, dos animais, dos sistemas, de citologia, genética... Não acho que a solução seja tornar a teoria de Darwin o conteúdo mais importante, mas acredito que, enquanto tivermos essa fragmentação do conhecimento, será complicado fazer os alunos entenderem a biologia de forma completa. Seria um passo interessante diminuir um pouco o conteúdo que o aluno recebe e racionalizar esse conhecimento.

Grande parte das pessoas que participaram da pesquisa (54%) afirmou acreditar numa espécie de evolução dirigida por Deus. Isso seria uma mistura de criacionismo e evolucionismo?
Existem duas posturas diferentes: uma na qual Deus fez o mundo e depois deixou a “máquina” funcionar sozinha; a outra é que Deus está o tempo inteiro interferindo e ajustando detalhes, colocando ordem na “máquina”. Darwin se aproximava da primeira posição. Talvez tenha havido um criador que fez o mundo, mas agora o mundo funciona com leis próprias e o objetivo da ciência é descobrir essas leis. A questão é que o empreendimento científico é um tipo de abordagem sobre o mundo que tenta descobrir regularidades na natureza e tenta explicá-las de forma racional, sem recorrer a argumentos sobrenaturais. Qualquer tentativa de se aproximar da ciência e evocar o sobrenatural está justamente indo de encontro ao seu objetivo.

Os pesquisadores norte-americanos argumentaram que a política naquele país influencia muito as opiniões da população sobre o evolucionismo. Segundo o artigo, o criacionismo está na plataforma política dos partidos. Isso também acontece no Brasil?
Existem alguns estados em que os governos implementaram o ensino religioso nas escolas. Recentemente houve uma polêmica em torno da lei instituindo essa disciplina nas escolas públicas do Rio de Janeiro. A governadora Rosinha Garotinho disse que não acreditava em evolução e conseguiu implantar uma lei estadual que permitia o ensino religioso. O problema é que existem quatro religiões prioritárias e muitas outras minoritárias e é inconstitucional ensinar uma e não as outras. O ensino de religiões é permitido pela Constituição brasileira apenas se não onerar o estado e se for uma disciplina facultativa, porque ninguém é obrigado a aprender os princípios de uma religião que não e a sua.

A abordagem do criacionismo e do evolucionismo pode confundir o que as pessoas entendem que seja científico ou não?
Acreditar na evolução supõe que uma teoria desse nível seja objeto de crença, o que não é verdade. As premissas religiosas são objetos de crença, mas teorias científicas não. Chamar a evolução e o criacionismo de teorias é equiparar duas coisas que não estão relacionadas. É uma disputa meramente verbal, porque o criacionismo é apenas a crença religiosa, que nem representa todas as religiões. O problema é que para o senso comum fica confuso estabelecer o que é científico e o que não é. É impossível dizer que o evolucionismo está provado porque, do ponto de vista filosófico e científico, não existe teoria provada. No entanto, todas as evidências nos levam a crer que ela é verdadeira.



Entrevista concedida a
Franciane Lovati
Ciência Hoje On-line
30/08/2006

Nenhum comentário:

Postar um comentário