Leia a íntegra da entrevista que Ricardo Waizbort, biólogo da Fiocruz, concedeu à CH On-line
Por:
Franciane Lovati
Publicado em 30/08/2006
|
Atualizado em 05/11/2009
|
|
|
|
|
A que podemos atribuir a baixa aceitação da teoria evolutiva no Brasil?
Ricardo Waizbort
– É preciso entender que, quando falamos em evolução,
estamos tratando de um assunto bastante abrangente. Uma pessoa que não
tem um ensino formal bem estabelecido vai responder a essa questão de
forma superficial, pois não compreende o que é a teoria de Darwin. Mesmo
entre os biólogos ela ainda é discutida; na educação fundamental e de
nível médio, é pior ainda. É um problema educacional mais complicado,
que não abrange apenas essa teoria, mas a ciência como um todo. As
pessoas não são capazes de pesar argumentos e evidências a favor ou
contra determinado conhecimento e por isso não são capazes de verificar
sua validade. Vivemos uma batalha muito mais retórica, de convencimento e
persuasão, do que uma batalha racional, em que são expostos argumentos e
evidências para debate. No Brasil, vemos uma situação de analfabetismo
científico muito preocupante, porque existem problemas na formação e
atualização dos professores.
O que pode estar errado com o ensino para que as pessoas não compreendam as teorias científicas?
“Em biologia nada faz sentido senão à luz da Evolução”, escreveu o biólogo Theodosius Dobzhansky em 1973. No entanto, se você analisar os livros de biologia atuais, a evolução
está perdida em muitas outras informações. O estudo dos vegetais, dos
animais, dos sistemas, de citologia, genética... Não acho que a solução
seja tornar a teoria de Darwin o conteúdo mais importante, mas acredito
que, enquanto tivermos essa fragmentação do conhecimento, será
complicado fazer os alunos entenderem a biologia de forma completa.
Seria um passo interessante diminuir um pouco o conteúdo que o aluno
recebe e racionalizar esse conhecimento.
Grande parte das pessoas que participaram da pesquisa (54%) afirmou acreditar numa espécie de evolução dirigida por Deus. Isso seria uma mistura de criacionismo e evolucionismo?
Existem duas posturas diferentes: uma na qual Deus fez o
mundo e depois deixou a “máquina” funcionar sozinha; a outra é que Deus
está o tempo inteiro interferindo e ajustando detalhes, colocando ordem
na “máquina”. Darwin se aproximava da primeira posição. Talvez tenha
havido um criador que fez o mundo, mas agora o mundo funciona com leis
próprias e o objetivo da ciência é descobrir essas leis. A questão é que
o empreendimento científico é um tipo de abordagem sobre o mundo que
tenta descobrir regularidades na natureza e tenta explicá-las de forma
racional, sem recorrer a argumentos sobrenaturais. Qualquer tentativa de
se aproximar da ciência e evocar o sobrenatural está justamente indo de
encontro ao seu objetivo.
Os pesquisadores norte-americanos argumentaram que a
política naquele país influencia muito as opiniões da população sobre o
evolucionismo. Segundo o artigo, o criacionismo está na plataforma
política dos partidos. Isso também acontece no Brasil?
Existem alguns estados em que os governos implementaram o
ensino religioso nas escolas. Recentemente houve uma polêmica em torno
da lei instituindo essa disciplina nas escolas públicas do Rio de
Janeiro. A governadora Rosinha Garotinho disse que não acreditava em evolução
e conseguiu implantar uma lei estadual que permitia o ensino religioso.
O problema é que existem quatro religiões prioritárias e muitas outras
minoritárias e é inconstitucional ensinar uma e não as outras. O ensino
de religiões é permitido pela Constituição brasileira apenas se não
onerar o estado e se for uma disciplina facultativa, porque ninguém é
obrigado a aprender os princípios de uma religião que não e a sua.
A abordagem do criacionismo e do evolucionismo pode
confundir o que as pessoas entendem que seja científico ou não?
Acreditar na evolução
supõe que uma teoria desse nível seja objeto de crença, o que não é
verdade. As premissas religiosas são objetos de crença, mas teorias
científicas não. Chamar a evolução
e o criacionismo de teorias é equiparar duas coisas que não estão
relacionadas. É uma disputa meramente verbal, porque o criacionismo é
apenas a crença religiosa, que nem representa todas as religiões. O
problema é que para o senso comum fica confuso estabelecer o que é
científico e o que não é. É impossível dizer que o evolucionismo está
provado porque, do ponto de vista filosófico e científico, não existe
teoria provada. No entanto, todas as evidências nos levam a crer que ela
é verdadeira.
Entrevista concedida a
Franciane Lovati
Ciência Hoje On-line
30/08/2006
|
|
|
Nenhum comentário:
Postar um comentário